Jornalismo de cultura pop com um jeitinho brasileiro.

Lobisomens Made in Brazil

Na verdade, eu queria dar pra esta matéria o título de “Lobisomens Caiçaras” mas vocês iam me achar ainda mais bairrista – o fato é que a autora da saga “Filhos da Lua”, Marcella Rossetti, não só ambientou sua história no Brasil como na nossa amada cidade de Santos #Familia013

Por THIAGO CARDIM

Com uma raiz que remonta aos mitos gregos, o mito do licantropo, o ser humano que se transforma em lobo (e, mais tarde, em uma criatura que é meio-humano e meio-lobo), existe de certa forma em uma série de culturas – é o Versipélio dos romanos, o Volkodlák dos eslavos, o Werewolf ou Dracopyre dos saxões, o Werwolf dos alemães, o Óboroten dos russos, o Hamtammr dos nórdicos… O que não falta é versão. Aquela que acabou sendo popularizada pela cultura pop, no entanto, costuma ser a europeia, que em plena Idade Media era associada a uma postura não-cristã, demoníaca, próxima da bruxaria.

Aqui no Brasil, lembremos, nosso folclore também tem uma série de variações desta lenda – em alguns cantos, por exemplo, diz-se que o sétimo filho de uma sequência de filhos do mesmo sexo vira lobisomem. Outra variação é ainda mais específica e deixa claro que um menino que tenha nascido em uma família depois de sete irmãs mulheres está destinado a se tornar a criatura. Há quem ainda defenda que é uma maldição familiar, que passa de pai pra filho depois que o mais velho morre. E também quem diga que é algo que se pega depois de ser mordido por um lobisomem. Tem lobisomem que se transforma na lua cheia, tem lobisomem que assume sua forma à meia-noite de sexta-feira numa encruzilhada…

E tem, claro, os trocadores de pele. No caso, os protagonistas nacionais de uma saga nacional chamada Filhos da Lua, escrita por Marcella Rossetti. Aliás, cabe aqui um adendo curioso: assim que o primeiro livro da autora me foi enviado pela AVEC Editora, ele foi parar direto nas mãos do meu filho mais velho. Que devorou, leu uma, leu duas, leu múltiplas vezes. E que me ganhou quando disse que os lobisomens da Marcella andavam pelas ruas da nossa cidade-natal, minha, do filhote e da autora, Santos/SP.

“A ideia surgiu após a faculdade de História, quando eu já estava trabalhando como professora em Santos”, conta Marcella, num papo exclusivo com o Gibizilla. Ela queria escrever algo com foco no público juvenil, mas ficou pensando em qual tipo de história teria real prazer em desenvolver. “Foi aí que me lembrei da campanha de RPG de mesa que joguei com meus amigos na adolescência. E adivinhem qual era o tema deste RPG? Lobisomem”.

O jogo ao qual a escritora se refere é Lobisomem: O Apocalipse, mais um desdobramento do popular Mundo das Trevas do qual também fazia parte o clássico Vampiro: A Máscara. A partir dele, ela se inspirou em alguns aspectos, como terem a transformação controlada e serem os heróis da trama ao invés dos clássicos vilões hollywoodianos. “Além disso, como amo ficção científica, fiz questão de misturar um pouco este tema. O que agradou bastante aos leitores, que se divertem criando muitas e muitas teorias”.

Apresentando os Filhos da Lua

Os lobisomens de Filhos da Lua, ou melhor, os trocadores de pele, não são criaturas descontroladas que se transformam na lua cheia ou nada do tipo (esqueça Um Lobisomem Americano em Londres) – na verdade, eles são treinados desde jovens para protegerem a humanidade de criaturas terríveis e de uma ameaça que se aproxima. “A mitologia é bem diferente da encontrada em outros livros do gênero. Inclusive, este é um dos pontos positivos mais comentados pelos leitores, que a consideram bastante diferente do que já leram. Essa diferença se deve muito aos outros elementos colocados na obra, como a ficção científica e o foco no cenário nacional”.

Na primeira obra, lançada em 2016 com o subtítulo O Legado, somos apresentados à protagonista Bianca, uma adolescente que não imagina que sua chegada na cidade de Santos desencadearia uma série de acontecimentos capazes de transformar completamente a sua vida e revelar os segredos de um perigoso mundo. Já a continuação, O Legado Sombrio, chegou às lojas ano passado e traz uma dose extra de ameaça conforme vai dando ainda mais detalhes deste universo de fantasia urbana ambientado no Brasil.

Mas, aliás, o público compra a ideia de fantasia urbana por aqui?

“Acredito que escrever fantasia urbana no Brasil, utilizando o cenário nacional como um dos elementos, funciona muito bem”, opina Marcella. Ela lembra que, sim, alguns leitores são resistentes ainda. Entretanto, são os próprios leitores que fazem avaliações na Amazon e no Skoob, por exemplo, falando sobre a experiência positiva que a leitura proporcionou. “Essas avaliações acabam chamando atenção de novos leitores e, assim, vamos criando nossa importante base de leitores e fãs, diminuindo esta resistência aos poucos”.

A opção por ambientar a história no litoral de São Paulo, ao invés das grandes metrópoles costumeiras, vem do amor que a autora sente por nossa região. “Nada melhor do que descrever cenários que estou familiarizada e que representam parte da história nacional, já que Santos é uma das cidades mais antigas do Brasil”, explica. Ela ainda conta que os leitores da região dizem adorar andar pelas ruas e locais pelos quais os personagens passaram e sentir como se estivessem no universo da saga. Mas o mais legal é que não fica só no bairrismo. “Até mesmo leitores de outras cidades já vieram visitar a cidade e passearam por todos os lugares citados no livro. É muito bom saber o quanto um cenário pode impactar o leitor”.

Vamos desdobrar este universo!

Bom, isso a Marcella já tá fazendo. Na real, este ano ela lançou a HQ Noite da Aniquilação, escrita por ela e desenhada por Levi Tonin (Born Cartolla), com uma trama ambientada 25 anos antes de Filhos da Lua: O Legado. Mas além do livro de número 3, que encerra a trilogia (claro!) e já está sendo escrito, tem uma obra sobre a ambientação, inclusive com contendo detalhes e regras para quem quiser jogar RPG nela, pra sair do forno.

“Também teremos um livro de contos da saga e talvez mais uma história em quadrinhos”, revela ela, que pensa ainda em escrever um roteiro de série inspirado nos Filhos da Lua. “Entretanto, preciso encontrar tempo para isso. Acredito que assim que finalizar a saga tentarei escrevê-lo e aí teremos que torcer para que alguma produtora se interesse”.

Mas o potencial criativo da Marcella não se restringe aos trocadores de peles. Ela conta que logo vai lançar um NOVO universo de horror em formato história em quadrinhos (e talvez também em livro) – com roteiro da própria e arte do mestre Alexandre Bar (que foi meu professor e banca do meu trabalho de TCC, mas isso é história pra outro dia). “E, de novo, a história se passa em nossa querida Santos”, diz. “Também tenho planos para iniciar ano que vem uma nova saga de livros, situada no Brasil”.

Definitivamente, a gente ainda vai continuar ouvindo (e lendo) muito o nome Marcella Rossetti. Enquanto isso, você pode baixar Noite da Aniquilação de graça no Kindle – e comprar tanto O Legado quanto O Legado Sombrio na Amazon e ajudar este jornalista de cultura pop que vos escreve.