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Nós vimos Agatha Desde Sempre

O caminho das bruxas…é longo e tortuoso, mas pode ser muito divertido: nova série Marvel  estreia com uma boa dose de mistério, sarcasmo e bruxaria, tentando resgatar pontos abertos por WandaVision

Por GABRIELA FRANCO

Os dois primeiros episódios de Agatha Desde Sempre, a nova série da Marvel Television estrelada por Kathryn Hahn, estrearam nesta quinta, 18 de setembro, no Disney+. Depois desse combo, um novo capítulo será lançado todas as quartas na plataforma.

Na série, a lendária bruxa dos quadrinhos que fez sua primeira aparição live action em WandaVision, Agatha Harkness (Kathryn Hahn), se encontra presa em uma realidade paralela mergulhada em melancolia e sem seus poderes arcanos. Uma realidade que, aliás, é claramente uma “série policial” inspirada na excelente Mare of Easttown

Sua sorte muda quando um adolescente candidato a bruxo aparece (Joe Locke, cujo personagem AINDA não tem nome) e a ajuda a romper as amarras do feitiço que a mantinha presa. O interesse de Agatha desperta quando o rapaz implora para que ela o guie pelo mítico Caminho das Bruxas – uma jornada mágica repleta de desafios que, ao final, promete recompensar a feiticeira sobrevivente com o objeto de seu desejo mais profundo. O de Agatha, claro, tudo leva a crer que seja o retorno do livro místico Darkhold…

Unidos pelo destino, necessidade ou conveniência, Agatha e seu misterioso cúmplice reúnem um coven de bruxas de linhagens diversas (uma das poções, uma oraculista e uma bruxa da natureza) que perderam seus respectivos status e aceitam se lançar na perigosa aventura. O elenco estelar conta com a presença de Kathryn Hahn no papel principal, acompanhada por talentos como Locke, Aubrey Plaza e Sasheer Zamata, entre outros nomes de peso.

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Recapitulando…

Em 2021, com a estreia de WandaVision, os fãs da Marvel conheceram a efusiva “Agnes” (Hahn). Ao longo dos episódios, Agnes desenvolveu uma amizade próxima com a recém-chegada Wanda (Elizabeth Olsen) até que a verdadeira identidade da intrometida vizinha foi revelada: ela era Agatha Harkness.

Agatha foi a primeira a descobrir que Wanda, também conhecida como Feiticeira Escarlate, havia encantado a cidade de Westview inteira, mudando sua realidade e moldando-a a seu bel prazer. Em um duelo de poderes ao final da série, Agatha ficou sob um feitiço imposto por Wanda que a transformou eternamente na vizinha…e que no começo de Agatha Desde Sempre já era uma outra realidade…

Confuso? Pode ser instigante ou…desestimulante quando uma série começa assim, meio na loucura, sem muita explicação, como um grande quebra-cabeças de mil peças que vão se juntando e montando um cenário muito maior ao longo dos episódios.

Nisso, Agatha… puxou WandaVision: um clash de realidades, deixando o espectador sem saber direito o que ou quem faz parte do quê e se as cenas são uma manipulação da realidade ou algo real. Por outro lado, já estamos meio saturados de séries muito explicadinhas, redondinhas, fechadinhas, que não dão ao espectador a chance de especular e imaginar milhões de cenários e personagens possíveis (mas sem aquele monte de teorias de fãs, calma).

E se tem uma coisa que fã de Marvel gosta, é justamente disso.

E se tem uma coisa que eu, enquanto fã da Marvel, também gosto é que a série tenha a sua própria personalidade e não precise usar o MCU como muleta. Até o momento, Agatha… acerta aqui.

Outro ponto positivo de Agatha Desde Sempre é o fato do elenco principal ser formado quase que exclusivamente de mulheres (Não-hétero? Não podemos afirmar com certeza, mas tivemos algumas pistas) e um homem gay, que tem como foco narrativo a bruxaria, um recurso amplamente utilizado em filmes e séries, explorado em diversos gêneros como terror, fantasia e aventura, despertando o fascínio do público devido a seu mistério e múltiplas interpretações.

MAS, inegavelmente, a bruxaria tem um papel POLÍTICO muito grande ligado a PODER e às MULHERES. Afinal de contas, a Caça às Bruxas que durou três SÉCULOS esteve aí para nos mostrar que tudo não passou de um conchavo da Igreja e do patriarcado para destituir mulheres dos poucos poderes e saberes que detinham na Idade Média e impedi-las de exercer as mesmas funções que os homens (Leiam Silvia Federici).

Outro ponto é, ao que parece, a bruxaria retratada ali  não vai ser uma bruxaria “da Barbie” ou “da internet” – e quanto a isso, quero dizer que não vai ser uma bruxaria “limpa” com uma estética bela e “do bem”. Logo nos dois primeiro capítulos, fica bem claro que Agatha não é lá muito tolerada pela comunidade bruxesca e que existem “assuntos mal resolvidos” entre ela e a personagem de Aubrey Plaza, uma bruxa bem soturna e violenta que inclusive a ameaça de morte logo nas primeiras cenas.

Portanto, a tensão vai ser latente. Agatha, que é uma persona-non grata no coven, precisa convencer um grupo de bruxas que a odeia a se unir à sua causa. Elas vão precisar trabalhar em equipe e saber quase instintivamente como agir. Elas não se conhecem, não trabalham bem juntas e discutem o tempo todo. Mas, de alguma forma, elas vão precisar conviver e sobreviver. Praticamente o que o patriarcado nos obriga a fazer 🙂

Então vai ter sim disputa e brigas por poder e assuntos diversos entre mulheres-bruxas e isso pode ser MUITO BEM DESENVOLVIDO ou pode ser um fiasco. Só o tempo (e os próximos episódios) dirá. 

No mais, a produção parece ser muito bem-feita em termos de CGI, produção de arte e efeitos, tudo de primeiríssima. Esteticamente, a série tem muitas referências a produções que caíram no gosto do público LGBTQIAP+ como O Mágico de Oz, Abracadabra e filmes de fantasia dos anos 80 como Willow, por exemplo.

Quanto à dramaturgia, as atrizes principais dão um show à parte. Kathryn Hahn está muito confortável na pele da sarcástica e trambiqueira Agatha, e Aubrey Plaza também já mostrou que não vai tornar sua jornada fácil. Ambas as atrizes já trabalharam numa mesma série, Parks and Recreation, mas nunca contracenaram. A química entre elas se mostrou “mágica” (com o perdão do trocadilho) e suas atuações caem muito pro exagerado, o teatral, o camp, sem medo de ser feliz, com direito a gargalhadas bruxescas no final,

Obviamente que o nerdola médio JÁ ESTÁ reclamando, porque geralmente é o que acontece quando eles deparam com uma série que NÃO TÊM HOMENS como protagonistas trocando socos. Há também o embate que já dura MESES sobre o personagem misterioso de Joe Locke ser ou não o Wicanno, um dos filhos de Wanda nas HQs. Mas enfim, POR ENQUANTO são apenas boatos – e o fato de homens reclamarem é um bom indício de uma série estrelada e co-produzida por mulheres.

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Quem é Agatha Harkness?

Ela foi uma personagem criada por Stan Lee em 1970 e teve sua primeira aparição em Fantastic Four #94. Mentora de Wanda Maximoff e tutora de Franklin Richards, Agatha e também teve um filho, cuja história ganha uma reviravolta – Nicholas Scratch (tem um easter egg a respeito logo no primeiro episódio da série!).

Embora nas HQs ela pareça uma mulher idosa (e, tecnicamente, ela é), estamos falando de uma feiticeira ainda mais velha do que parece, tendo vivido desde a época anterior ao afundamento da Atlântida, dezenas de milhares de anos no passado da Marvel. Prolongando sua vida por meios mágicos, usando sua bruxaria primitiva, muitas vezes de influência sombria, Harkness viveu inúmeras vidas, tendo sido uma das bruxas originais do famoso caso das Bruxas de Salem, por exemplo. 

A história de Agatha é repleta de tentativas de formar novos clãs e consolidar o poder entre as mulheres de seu círculo. Após os Julgamentos das Bruxas de Salem, durante a Guerra Civil Americana, Harkness chegou a formar um grupo conhecido como Filhas da Liberdade, que ela treinou nas artes mágicas – uma prática que ela continuaria pelo menos até a Segunda Guerra Mundial, quando foi recrutada pelo Exército dos EUA para ajudar a derrubar místicos  nazistas.

E pegando um atalho entre história e cronologias das HQs para explicar algo que pode ser crucial para a série: foi absorvendo a mágica sombria de Agatha e dominando o Darkhold que Wanda consegue engravidar de seus filhos gêmeos, Wiccano e Célere. Ao recobrar seus poderes, Agatha apaga a memória de Wanda sobre os filhos… só que, como vocês podem imaginar, isso não dá muito certo. Parte desse rolê, aliás, a gente vê no último filme do Doutor Estranho

Desde então, Agatha já passou por diversas histórias e reformulações (inclusive até um atual “rejuvenescimento” visual nos quadrinhos, no retorno do título solo da Feiticeira Escarlate), mas sempre faz aparições esporádicas quando alguma trama demanda o uso de bruxaria arcana e manipulação de energias sombrias.

Vamos ver como será seu destino em Agatha Desde Sempre – que, pelo menos a princípio, parece bem promissora.

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