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Chegou a hora do adeus para Agents of SHIELD

Para alguém que acompanhou a série durante sete temporadas, com todos os seus altos e baixos, é uma delícia vê-los partindo no caminho que deveriam ter trilhado SEMPRE

Por THIAGO CARDIM

Quando a Marvel anunciou que lançaria a série Agents of SHIELD, devidamente protagonizada por um Agente Coulson trazido diretamente da terra dos pés juntos depois de seu destino trágico no primeiro filme dos Vingadores, devo dizer que EMPOLGUEI.

O principal motivo da minha ferveção ao saber do projeto é que, bom, teríamos semanalmente um conteúdo que faria conexão direta com o universo compartilhado da Casa das Ideias nos cinemas, uau, que coisa linda, já imaginou os atores das telonas aparecendo em participações especiais? Mas isso foi lá em 2013. E o Thiago Cardim de hoje, definitivamente, já não coloca o tal “universo compartilhado” como centro de suas atenções ao pensar num filme ou série – na real, o Thiago Cardim de hoje só quer ver uma boa história. E se isso significar não ter que respeitar uma tal cronologia, não se conectar com outros quatro filmes diferentes, cagar e andar para todo o conceito do que é o MCU… que seja.

A dependência do conceito de universo compartilhado, aliás, foi o PRINCIPAL erro de Agents of SHIELD em todos os momentos que de fato ERROU ao longo de suas sete temporadas. Quando os produtores se permitiram podar criativamente para fazer relação com algo que estava acontecendo nos cinemas ou então fizeram uma virada narrativa completamente desnecessária só para justificar uma simples menção a um evento das telonas, eles erraram FEIO.

Mas Agents of SHIELD, senhoras e senhores, esta série que chegou ao fim no último mês de agosto, teve muitos baixos, isso é fato. Mas também teve MUITOS altos. E estes foram nos pontos em que resolveu construir a sua própria história, lidando com sua própria mitologia, desenvolvendo seus próprios conceitos. Sozinha. Sem muletas. Quando Agents of SHIELD serviu a si mesma ao invés de se colocar no papel de armadora para que o cinema chutasse para o gol, definitivamente foi uma das melhores séries inspiradas em HQs exibidas pela TV contemporânea.

Sem exageros aqui, falando a real.

E isso, sejamos honestos, em muitos momentos sem sequer precisar recorrer aos personagens dos gibis. Porque, vamos lá, Daisy / Tremor (Chloe Bennet) e Elena / Yo-Yo (Natalia Cordova-Buckley), por exemplo, se tornaram personagens de longe muito mais interessantes do que suas contrapartes nas HQs, com muito mais contornos e camadas. O casal Fitz (Iain De Caestecker) e Simmons (Elizabeth Henstridge), definitivamente a melhor coisa do seriado, nunca existiu previamente nos gibis e simplesmente roubou a cena – por sinal, dada a quantidade de mudanças pelas quais Fitz passou, se transformando, se encontrando, indo além do estereótipo do gênio nerd babaca e representando até um vilão SENSACIONAL, o De Caestecker merecia demais ter sido melhor reconhecido pelo seu trabalho na indústria televisiva.

Enfim.

Assistir ao último episódio de uma série que você acompanhou religiosamente ao longo de SETE anos tem um sabor meio estranho mesmo. No caso de Agents of SHIELD, claramente é agridoce. Porque você enxerga as cagadas que todo mundo diz que são visíveis ali, tudo bem. Mas você também consegue ver onde ela foi brilhante, como no caso daquela quarta temporada, aquela na qual apareceu o Motoqueiro Fantasma, na qual eles souberam trabalhar o ritmo com inteligência e uma precisão que faziam o espectador ter tesão de voltar na semana que vem. Mal sabiam eles (ou será que sabiam?) que, ao trabalhar com diversos ARCOS diferentes numa mesma temporada, os tais PODS, estavam reproduzindo o jeito de contar histórias que os melhores quadrinistas de gibis de heróis conhecem há décadas.

A sétima e última temporada, no fim, depois de uma quinta e uma sexta BASTANTE irregulares (pra não dizer duas merdas gigantescas), de alguma forma lembrou a quarta temporada e isso foi MUITO legal. Teve toda uma leveza, mesclando humor e ação, do tipo que só se vê quando tá claro que tá todo mundo ali se divertindo DEMAIS.  

As muitas viagens no tempo, os episódios temáticos em cada uma das décadas, desde o noir preto e branco nos 1950 até o multicolorido e exageradamente pop nos anos 1980, uau, tudo deu um calorzinho no coração. Mas quando rola toda uma trama DENTRO da cabeça da Simmons, com um bando de aliens cibernéticos (ou algo assim, tá tudo bem, não fica procurando explicação) em busca do paradeiro de Fitz, UAU em dobro. Doce e ao mesmo tempo sofrido, para torcer o coração de qualquer um que acompanhou a história de amor do casal.

Tudo cheio de boas referências, com uns bônus aqui e ali para o espectador mais dedicado, mas sem precisar ter que retomar um monte de personagens antigos apenas PORQUE SIM. O que aconteceu foi bem amarradinho e fez sentido para a trama como um todo. Saber ser econômico enquanto contador de história é igualmente uma dádiva.

Foi uma boa despedida, eu diria. Com Agents of SHIELD dependendo apenas e tão somente de si mesma. Sabe Thanos e o estalar de dedos? Nem sinal de qualquer impacto ser sequer mencionado. AINDA BEM. Capitão América, Homem de Ferro, Thor, Hulk? Porra nenhuma. AINDA BEM (2).

Agents of SHIELD partiu com dignidade, sendo Agents of SHIELD e não “aquela série que precisa apoiar o MCU”. E, de verdade, a sequência final, a despedida dos personagens, foi linda, tocante, memorável. Me encheu os olhos d’água. E os posicionou em lugares que um bom roteirista de cinema na nova fase cinematográfica da Marvel tranquilamente poderia pegar, do tipo “olha só, dá pra usar este cara aqui como coadjuvante apenas porque…”. Daria. Assim como daria para pensar num monte de futuros spinoffs. Ô se daria. Mas, de verdade, eu até preferia que não. Se for pra cagar, melhor evitar.

Deixa Agents of SHIELD como tá. Não em nome de seus erros, mas principalmente em nome de seus acertos. A série merece ser preservada. Tá tudo bem. Segue o baile. Tem novas histórias pra se contar a partir de agora.