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Mayara & Annabelle: uma nova fase dentro e fora das HQs

Batemos um papo com um dos pais da dupla, fenômeno dos gibis independentes brasileiros que agora conta com o apoio de uma editora e está caminhando pra virar série de TV

Por THIAGO CARDIM

Mayara & Annabelle não são exatamente super-heroínas naquele modelo clássico que a gente conhece, Marvel e DC Comics, uniformes multicoloridos, alcunhas mirabolantes, identidade secretas. Duas funcionárias públicas, uma ninja e uma maga, elas combatem demônios, monstros e tudo que é coisa sobrenatural. Dá pra dizer que são heroínas porque, bom, garantem a paz e a tranquilidade da população do Ceará e adjacências. E são de alguma forma “super” porque, vamos lá, também têm lá seus superpoderes. Mas as duas são de fato SUPER-HEROÍNAS, assim mesmo, em caixa alta, por tudo que andaram fazendo no mercado editorial independente brasileiro na última década.

Quando tive a chance de conversar pela primeira vez com os dois autores da história, Pablo Casado (roteiro) e Talles Rodrigues (arte), foi lá em 2014, às vésperas da primeira edição da CCXP, ainda conhecida como Comic Con Experience. Tinham acabado de sair de uma bem-sucedida campanha de financiamento coletivo, lançando a 1ª edição das aventuras de Mayara & Annabelle. O sonho era transformar a história em uma HQ contínua, seriada, ao invés de fechar em apenas único especial. “Estamos bancando o gibi do próprio bolso e esperando que as vendas empatem os custos e, se tudo der certo, garantam a impressão do volume 2”, apostou o Pablo, em entrevista que fiz com eles pro JUDÃO.com.br.

Quatro anos depois, em 2018, eles tinham feito uma série de campanhas subsequentes no Catarse, garantindo os volumes, 2, 3, 4 e 5. Talles e Pablo foram, no fim, tão heroicos e persistentes quanto suas próprias criações. “Acho que a maior recompensa para quem já acompanha a série seja poder ler a conclusão desse primeiro arco. Quantos quadrinhos seriados brasileiros não ficaram pelo caminho, né?”, afirmou o roteirista Casado, numa nova conversa com a gente.

Mayara & Annabelle não só não ficaram pelo caminho, como encontraram um OUTRO caminho. Depois de anos construindo uma presença e uma base de fãs graças ao suor de seus dois pais, elas foram “adotadas” por uma editora. Pela Conrad, além de terem os volumes originais devidamente relançados, ganharam novas aventuras – incluindo Conflitos Internos, seu mais novo arco, cujo primeiro volume acaba de chegar às lojas especializadas.

A bolha furou ou apenas cresceu?

Depois de uma batalha épica em São Paulo contra demônios infiltrados na Secretaria de Controle de Atividades Fora do Comum – a SECAFC –, a dupla retorna à Fortaleza para seguir com seus trabalhos. Além de organizar a papelada acumulada (burocracia também é um inimigo daqueles…), elas precisam ajudar na formação dos novos funcionários. Mas tudo se complica quando encontram pistas de um assassino em série usando magia contra suas vítimas. 

“Elas agora precisam lidar com as consequências da luta anterior e o mundo ficou um pouco mais sombrio”, explica Talles, o desenhista, num papo com o Gibizilla. “A Secretaria do Ceará, que antes era uma das mais abandonadas devido à falta de atividades sobrenaturais, agora está sobrecarregada e novos funcionários precisam ser treinados e entrar na labuta, prontos ou não”.

Afinal… chegamos num momento em que Mayara & Annabelle ganharam FÃS, né? Já se tornaram personagens que furaram uma bolha do underground? “Eu não sei dizer ao certo”, confessa o criador, aos risos. “O que eu sei é que, graças à Conrad, o quadrinho chegou em mais gente ainda, e nos eventos eu ouço bastante comentários tipo ‘ah, já ouvi falar dessa história no podcast x ou no blog y’, ou pessoas que trazem os amigos na mesa pra mostrar a HQ e tentar convencer eles a comprar”.

Ele diz ainda que aumentou bem a quantidade de leitores mais novos e que também estão interessados em fazer quadrinhos. “Não sei se a bolha está necessariamente furada, mas talvez a gente esteja aumentando a bolha, pelo menos?”.

Depois de tanto tempo fazendo tudo por conta própria, Talles conta que tem sido uma experiência de muito aprendizado ter suporte para o desenvolvimento de novas histórias desta dupla, ao invés daquela clássica ralação independente. “Na parte técnica, eu aprendi coisas de editoração que eu fazia meio do jeito que dava no independente e agora tem uma equipe incrível cuidando e guiando a gente”, explica, deixando claro que existe zero interferência do ponto de vista criativo. “Também é ótimo não precisar guardar o próprio estoque em casa e saber que o quadrinho tá chegando no Brasil inteiro”.

Mas este sucesso significa, portanto, que Talles e Pablo também tiveram seus próprios nomes impulsionados como criadores, junto com Mayara & Annabelle? Algo que ajude a colocar de pé OUTROS projetos deles, ainda que separados? “Bom, tanto eu como o Pablo tivemos algumas dificuldades com campanhas no Catarse recentemente, então eu não sei dizer ao certo”, confessa ele. “Por um lado, quem conhece a HQ pode se interessar por mais trabalhos da gente, mas ao mesmo tempo está ficando cada vez mais difícil se comunicar através de redes sociais, os posts não alcançam mais ninguém, parece que todos os dias temos que pensar em estratégias novas pra aparecer…”. É, a gente te entende COMPLETAMENTE por aqui.

Algoritmos, sim, estamos falando de VOCÊS.

Ele afirma ainda que a impressão que fica é: quem leu a HQ, gostou e quer mais trabalhos dos dois.  “Mas daí a conseguir fazer essas pessoas saberem que tem mais coisa pra ler…”.

Tal qual acontecia nas edições clássicas, o “volume 1” estampado na capa de Conflitos Internos indica que os planos pra Mayara & Annabelle são mesmo a longo prazo. “Esse arco foi pensado pra 3 volumes, um deles tá pronto e já estamos trabalhando nos outros 2”, diz ele.

E enquanto os planos para as HQs permanecem sólidos, sem aquela incerteza do futuro pós-volume 5 na CCXP 2018, temos OUTROS planos em andamento. Ou Talles achou que a gente ia esquecer da já anunciada série live-action das suas caçadoras de demônios? Sim, sim, produzida pela Floresta, que é o braço de produção da Sony, e pela Clube Filmes. “Eu nem sei mais o que eu posso e não posso contar?”, diverte-se Talles, nos despistando. Mas o anúncio, feito em 2022, continua de pé. “Existe um projeto em andamento”, confirma ele.

Então tá bom. Melhor assim. E que esta magia se espalhe cada vez mais, em diferentes e diversas plataformas. Elas (e eles) merecem.

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