Pequeno guia de direitos autorais para artistas independentes
Um olhar simples, prático e direto sobre algumas dúvidas que assombram diversos artistas, ainda mais no que algumas pessoas acreditam ser uma terra sem lei chamada “internet”
Por LAURA ATHAYDE (texto e ilustrações)*
(material originalmente publicado no site Minas Nerds e republicado com autorização da autora)
Eu, como ilustradora e quadrinista, sempre tive muitas dúvidas sobre direitos autorais, especialmente depois de ter trabalhos meus plagiados e reproduzidos sem assinatura pela internet afora mais de uma vez. Sei que esse é um cenário comum pra artistas em geral, especialmente aqueles que trabalham de forma independente, sem um departamento jurídico pra assessorá-los ou o peso moral do nome de uma empresa pra intimidar eventuais plagiadores.
Por isso, decidi pesquisar e compilar aqui, de forma simples e prática, as respostas pras minhas principais dúvidas! Espero que esse guia seja útil pra outros artistas e também pro público em geral que quiser saber mais sobre como utilizar, ou não, determinada arte.
A Lei que regulamenta os direitos autorais no Brasil é a nº 9.610, de 1998. Ela protege a expressão das ideias literárias, artísticas ou científicas, assegurando aos autores o direito exclusivo de utilizar, publicar ou reproduzir suas obras.
As obras protegidas pela Lei são trabalhos publicados ou não publicados nas áreas de literatura, teatro, pintura, escultura, filme, trabalhos visuais de arte (inclusive fotografias e softwares), música e coreografias (você pode conferir a lista completa de trabalhos protegidos no artigo 29 da Lei.
Vale ressaltar que outros tipos de criações não previstos no texto legal também são protegidos, como, por exemplo, sites. Os únicos requisitos são que a obra seja original e que contenha um esforço criativo do autor, além de habilidade técnica.
Você pode registrar seu trabalho na Biblioteca Nacional, na Escola de Belas Artes da UFRJ, na Escola de Música da UFRJ, no CONFEA (obras de engenharia, arquitetura e urbanismo) ou no INPI (softwares). Contudo, isso não é obrigatório.
Ou seja, mesmo que você não tenha publicado ou registrado o seu trabalho, ele ainda é protegido pela Lei de direitos autorais.
Vale ressaltar que o registro de obras é pago! Você pode consultar os custos de registro na Biblioteca Nacional aqui.
Qualquer meio de prova é válido. Prints, posts ou e-mails com data que comprovem que você tinha posse da obra antes de qualquer outra pessoa, por exemplo, servem pra mover um processo por violação de direitos autorais.
Um amigo fotógrafo uma vez deu a seguinte dica: assim que você finalizar a obra, envie uma cópia para si mesmo e deixe fechada no envelope, com o carimbo dos correios e a data de postagem na embalagem. Assim, você tem uma declaração de um órgão com reconhecimento judicial da data em que finalizou a obra.
Primeiro, vamos diferenciar cessão de licença: cessão é o que acontece quando você, por meio de um contrato, transfere permanentemente os direitos patrimoniais sobre a sua obra; licença é quando você cede esses direitos temporariamente. Esses direitos podem ser de uso ou comercialização da obra, depende do que estiver previsto no contrato.
E agora, vamos ao que interessa: não, você não vai deixar de ser o autor! O criador tem pra sempre direito moral sobre a obra. Em outras palavras, mesmo que você ceda ou licencie os direitos patrimoniais (de uso/comercialização), o seu nome sempre deverá permanecer vinculado ao seu trabalho.
É preciso diferenciar coautor de colaborador. O coautor é quem efetivamente criou a obra em conjunto com o autor e, portanto, também é considerado autor e tem os mesmos direitos dele.
Já o colaborador é alguém que auxiliou o autor na criação da obra revisando, atualizando ou opinando, mas não teve efetiva participação intelectual na sua criação. Portanto, não possui direitos autorais.
O organizador de coletâneas também tem seus direitos protegidos por lei, porque o esforço de seleção, organização ou disposição de obras de outras pessoas também é considerado criação intelectual.
Contudo, o direito dos autores deve ser respeitado. As suas obras só podem ser reproduzidas com a devida autorização (cessão ou licença), e mesmo assim é obrigatório respeitar o seu direito moral (ou seja, manter o nome do autor junto à obra).
Sim! Mas só se você tiver autorização do autor original e as suas intervenções não representarem modificação da obra. Caso a obra original tenha caído em domínio público (o que acontece 70 anos depois da morte do autor), não precisa de autorização.
Violação de direito autorais é CRIME! Portanto, você pode denunciar o plagiador pra polícia e ele pode ser preso e/ou pagar multa, de acordo com o artigo 184 do Código Penal Brasileiro. Vale notar que já existem, em algumas cidades, delegacias especializadas em crimes virtuais; portanto, se o uso indevido da sua obra tiver acontecido na Internet, você pode denunciar lá.
Você também pode cobrar o plagiador por ter usado indevidamente a sua obra e/ou pedir que ele a tire de circulação. Isso pode ser feito no Juizado Especial Cível, caso o valor da ação não ultrapasse 40 salários mínimos (o que, atualmente, dá R$ 44.000,00) e, nesse caso o processo não terá custas. No Juizado, você não precisa de advogado pra valores de até 20 salários mínimos, ou R$ 22.000,00.
(Observe que esses valores são pertinentes a 2021! Verifique o valor do salário mínimo vigente pra saber quais são os limites agora).
Caso o valor seja maior do que esse, você pode procurar a Justiça comum. Você vai precisar de um advogado; caso não tenha como pagar um, pode ir à Defensoria Pública da sua cidade, que geralmente fica no próprio fórum. Se você comprovar que não possui renda suficiente pra cobrir as despesas do processo, ele será gratuito.
Finalmente, caso a sua obra tenha sido utilizada de uma forma com a qual você não concorda ou adulterada, você também pode cobrar do plagiador indenização por danos morais!
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* Sobre Laura Athayde > Após terminar a pós graduação em Direito Tributário, em 2014, passou a dedicar-se à ilustração e ao quadrinho. Participou de diversas publicações coletivas, como o livro Desnamorados, Revista Farpa, Revista RISCA!, Antologia MÊS 2015 e Catálogo FIQ 2015. Lançou também HQs solo, algumas das quais podem ser lidas online em issuu.com/lauraathayde. Recentemente, publicou pela Balão Editorial a coletânea Aconteceu Comigo, que nasceu como uma série no Instagram. Nela, Laura deu vida à relatos de mulheres anônimas, compartilhando seus sofrimentos, dores e superação. Seus relatos, adaptados para a linguagem dos quadrinhos, revelam dores, desejos e afetos que tornam as suas vivências únicas e, ainda assim, permitem que nos identifiquemos com elas.